quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

QUESTÃO DE FÉ

Confesso que tenho certo asco por religiões. Algumas mais do que outras, é verdade. Há um certo desconforto dentro de mim quando me deparo com alguns, digamos, dogmas. Mas estou longe de ser ateia. Ateus geralmente não acreditam em milagres e eu os vejo praticamente todos os dias.

Vivenciei e tenho vivenciado um grande milagre em minha vida e a quem o atribuo? A alguma entidade máscula, paternal a la Jeová ou Allah? Não. É claro que não.  E sim a uma sacralidade que foge ao entendimento lógico, mas que é facilmente captada pelo sentido da contemplação, da existência, da plenitude, do contentamento, da gratidão.

O que é a lógica, a razão ou a verdade empírica, afinal de contas? Por mais que façamos experimentos e utilizamos de ferramentas tecnológicas das mais complexas, em maior ou menor grau, estaremos sempre limitados aos nossos sentidos. Pois é através deles que estamos condicionados a experimentar o mundo, a vida. De que adianta um telescópio sem a visão, não é mesmo? Ela é o fim em si mesma. E o quanto a nossa visão já nos enganou antes de serem inventadas, por exemplo, as lentes de aumento? E o que mais precisaremos inventar para poder enxergar os nossos enganos?

Ou será que engano mesmo seria essa nossa tentativa constante de aprisionar a verdade? O ser humano é movido pela curiosidade de saber o porquê das coisas, pois somos seres motivados.  Políticos. Desde que aprendemos a falar imagino que desenvolvemos também a arte de convencer.

E se não existir um "por quê"?

As vezes eu me preocupo com isso. Com a minha espécie de "convencimento". Quando alego a minha contrariedade e em muitos casos revolta com determinadas convicções religiosas claramente preconceituosas e arcaicas, eu não quero com isso que as pessoas percam a sua fé - como se isso fosse possível. Se eu concordo com Nietzsche sobre a morte de um "deus-entidade", por outro lado, sou completamente a favor da manutenção do Sagrado.

Sob minha perspectiva ter fé é tão importante quanto pensar racionalmente. Nós, seres humanos, não precisamos apenas de métodos, táticas ou técnicas para vivenciarmos as nossas experiências é preciso também arriscar no desconhecido, que é sempre o próximo passo, o futuro. Aquilo que ainda não existe, mas está lá. Ou estará.

A fé envolve assumir riscos. Se não tivermos fé não daremos um passo à frente, imobilizados pelo medo. Acreditamos no que vemos, ouvimos ou sentimos e sentenciamos a partir disso os nossos julgamentos mais arraigados. Temos fé sobre os nossos próprios sentidos.

Quando acreditamos piamente em algum discurso e também o propagamos  não é através dessa arte do convencimento que dirigimos as nossas vidas, guiados pela fé dessas verdades? O que são, afinal, convicções? Filosofias?

No entanto, a crítica é tão importante quanto os nossos valores e crenças. Porque precisamos aprender que tudo é ponto de vista, que podem ser discordantes, prejudiciais ou não para mim ou para o outro. Vivemos sob jogos de poder, de interesses e, as vezes, disseminamos ódio pensando distribuir flores.

É uma questão que também levo para mim. Jamais pretendi acabar com a fé de ninguém quando faço críticas severas a determinadas convicções religiosas. A minha própria fé é imensa. Não se trata da ilusão de que num uni(multi)verso tão vasto e rico uma poeira de carbono feito eu seria capaz de magoar uma entidade divina tão poderosa que me olha lá de cima. Trata-se apenas da certeza  de que sou parte desse poder Divino, como qualquer outro ponto de energia vagando pelo infinito. E se não tenho a capacidade de magoar uma entidade Divina superior, por outro lado, sou capaz de magoar um ser sagrado, igual a mim, que está ao meu lado.

Não é possível discutir fé. Ela simplesmente existe e faz parte de nossa essência, tal como a razão. Mas precisamos estar sempre  atentos às nossas convicções que pela fé são emanadas. Romper com preconceitos e tradições arcaicas, mudar um ponto de vista ou torná-lo mais complexo não fará de nossa fé falha ou falsa, porque ela sempre estará lá nos guiando com as nossas novas ou velhas concepções.

A fé é divina, sagrada, eterna. Assim como cada um de nós.